
Uma pessoa perguntou se dizer que Cristo “morreu em nosso lugar” é suficiente para descrever a Substituição Penal.
Reposta: Não é.
Se Cristo morreu em nosso lugar, é preciso perguntar: Que morte é essa que ele recebeu? Quem a aplicou? Por quê? Com qual propósito?
Substituição Penal é: Cristo morreu punido pelo Pai em nosso lugar para satisfazer a ira de Deus, ou algo equivalente. É uma doutrina sobre satisfação da justiça punitiva (presmindo que não há saída não-punitiva), sobre uma ação do Pai (ou da Trindade), sobre como se dá o nosso perdão, sobre como Deus é “reconciliado” conosco. É mais do que apenas “em nosso lugar”.
Se você diz apenas “Cristo morreu em nosso lugar”, sem os demais elementos, e não dá nenhum contexto, isso pode significar várias coisas diferentes.
Pode significar, por exemplo: Cristo morreu em nosso lugar quando tentado/atacado/punido pelo diabo (Christus Victor), ou Cristo morreu como resgate dado ao diabo em troca da nossa libertação (resgate), ou Cristo morreu dando ao Pai o sacrifício que não éramos capazes de dar (adoração/penitência), ou Cristo morreu como um ser humano (Recapitulação), ou Cristo absorveu toda a maldição que havia sobre a humanidade — que fora “lançada” pelo Pai, mas sem ser aplicada pelo Pai sobre ele, e sem relação com o perdão ou satisfação —, ou várias outras opções.
Ademais, “em nosso lugar” pode ser lido como representação, em vez de substituição — como um advogado fala em lugar do seu representado, mas sem tomar o lugar do presentado literalmente (sem sofrer a punição em seu lugar), ou como um intercessor que ora por alguém, sem necessariamente tomar o lugar daquela pessoa (que também deve orar por si mesma).
É interessante, inclusive, o fato de que, em 1João 2:2, a expiação ou propiciação seja vista como a ação de um advogado (paraklētos), alguém que chamamos para estar ao lado (parakaleō), compadecendo-se e tomando nossas dores, mas sem ser punido em nosso lugar.
O que acontece é que algumas pessoas estão acostumadas a ler “em nosso lugar” dentro da Substituição Penal e não conhecer outras leituras possíveis, então associam rigidamente as duas ideias, como se uma fosse uma versão mais simples ou primitiva da outra, o que não é verdade.
A Bíblia diz apenas “por nós”, e vários textos provam que o sentido correto disso é “em nosso benefício”, “por amor a nós”, ou algo do tipo. Cristo ressuscitou “por nós”, ele hoje intercede “por nós”, e assim como ele morreu “por nós”, devemos morrer por nossos irmãos — não punidos pelo Pai, mas certamente quando nossos irmãos são atacados pelo Inimigo.
Os textos biblicos intencionalmente evitam a preposição que significa principalmente “em lugar” (anti) e usam aquela que normalmente não significa “em lugar” (hyper). Algumas poucas traduções fortemente protestantes (como ARA e NAA) até tentam emplacar a ideia, mudando dois textos bíblicos, mas não conseguem mudar o grego. A Bíblia evita falar em “substituição” e não a sugere de nenhuma maneira, embora seja correta como descrição de algumas facetas (não penais).
Rev. Gyordano M. Brasilino