1. Até a Reforma Protestante, não havia um princípio claro como “Sola Scriptura”. Havia a suficiência das Escrituras, mas ela não era contraposta à Tradição.
2. Antes da Reforma, não havia uma explicação clara e uniforme da relação entre a Escritura e a Tradição. Havia vários discursos. Olhar retrospectivamente para esses documentos patrísticos ou escolásticos e ver apenas “suficiência material” é tão anacrônico quanto ver “Sola Scriptura”.
3. O princípio Sola Scriptura surgiu quando, na interpretação de Lutero, as Escrituras e a autoridade eclesiástica se contradisseram. O princípio não significa necessariamente rejeição da Tradição, mas significa, sim, a “rejeitabilidade” de algum dos seus elementos.
4. Mesmo depois da Reforma Protestante, não se estabeleceu uma maneira única de explicar o princípio Sola Scriptura. As tradições protestantes têm perspectivas diferentes do que ele significa.
Texto originalmente publicado em 27 de fevereiro de 2019, na minha página do Facebook.
A Reforma Protestante costuma ser explicada a partir de alguns princípios, mas há sempre uma forma radical e uma forma equilibrada de tratar esses princípios.
SOLA FIDE Forma Equilibrada — A salvação é somente por meio da fé em Cristo. Essa fé salvífica é uma fé viva e frutífera, que opera em amor, não uma fé morta. Forma Radical — A salvação é somente por meio da fé em Cristo, e essa fé não tem qualquer relação com as obras. Não há qualquer necessidade de busca da santidade de vida (antinomismo).
SOLA GRATIA Forma Equilibrada — Do começo ao fim, a salvação resulta da graça de Deus, pelos méritos de Cristo, que se tornam nossos de muitas maneiras (meios de graça, especialmente os sacramentos). Forma Radical — Do começo ao fim, a salvação resulta da graça de Deus, e essa graça não está ligada a nada, sendo totalmente invisível e conhecida apenas internamente.
SOLA SCRIPTURA Forma Equilibrada — Todos os artigos da fé cristã estão explícitos ou implícitos nas Escrituras Sagradas, havendo um papel fundamental na Tradição como preservação do sentido correto dessas Escrituras. Cada cristão pode fazer o livre exame dessas Escrituras, respeitando o papel histórico da Igreja como sua guardiã. Forma Radical — Todas as verdades da fé cristã devem estar explícitas nas Escrituras Sagradas. Não há lugar para credos ou tradições (Solo Scriptura), portanto cada cristão é livre para interpretar as Escrituras.
SOLO CHRISTO Forma Equilibrada — Cristo é o único caminho de salvação, e ele vem a nós através do seu corpo, cuja missão espiritual é não apenas falar sobre Cristo, mas realmente levar Cristo às pessoas. Forma Radical — Cristo é o único caminho, portanto a Igreja é dispensável e desnecessária para a salvação.
SOLI DEO GLORIA Forma Equilibrada — Toda a glória deve ser dada a Deus, e devemos honrar aqueles que nos precederam na fé e nos deixaram (em doutrina e em vida) exemplos de fé fundamentais para a nossa santificação. Maria é a mãe de Deus, bendita entre as mulheres. Forma Radical — Toda a glória deve ser dada a Deus, portanto nenhuma outra pessoa deve ser digna de honra ou pode servir de exemplo. Maria foi uma mulher comum.
SACERDÓCIO UNIVERSAL Forma Equilibrada — Cada cristão é vocacionado por Deus a exercer um sacerdócio com sacrifícios espirituais (oração, jejum, obras de misericórdia), testemunhar do nome de Cristo, intercedendo por outras pessoas. Os ministros do evangelho são pais espirituais. Forma Radical — Todo cristão tem autoridade total para exercer1 qualquer ministério. Nenhum dom específico é concedido por Deus a certas pessoas para exercerem ministério do evangelho. Os ministros do evangelho são só professores.
O radicalismo é uma disjunção entre: – Fé e Obras – Graça e Sinal – Escritura e Tradição – Cristo e Igreja – Adoração e Comunhão dos Santos – Sacerdócio e Pastorado
Portanto, já que estamos recebendo um Reino inabalável, sejamos agradecidos e, assim, adoremos a Deus de modo aceitável, com reverência e temor, pois o nosso “Deus é fogo consumidor!” (Hebreus 12:28,29)
Todos os cristãos concordam que somente Deus deve ser adorado, e que somente deve ser adorado como sua Palavra estabelece. Existe um modo aceitável (euarestōs) de se adorar a Deus — o que quer dizer que há também um modo inaceitável. Todas as tradições cristãs vêem em Hb. 12:28,29 uma clara afirmação da seriedade com que se deve tratar os limites do culto comum. Mas entre os cristãos protestantes, há um debate sobre o que constitui de fato uma liturgia obediente à Palavra. Significa que devemos fazer apenas o que a Escritura não proíbe, ou que devemos fazer apenas aquilo que ela manda? Há graus distintos de liberdade. Continue lendo “Contra o Princípio Regulador do Culto”