Espírito e espírito

As traduções bíblicas não são neutras! Você sempre recebe a doutrina do tradutor junto.

Uma questão que é discutida há bastante tempo pelos tradutores da Bíblia e exegetas, mas que é praticamente desconhecida da maioria dos leitores, é o modo como traduzimos “espírito” ou “Espírito” no Novo Testamento e particularmente nas cartas de São Paulo.

Eu colocaria o problema da seguinte maneira: o texto bíblico grego não nos dá, em todos os casos, razões gramaticais suficientes para distinguir entre “espírito” (um espírito humano ou qualidade sua) e “Espírito” (o Espírito Divino). Ademais, a maneira como vertemos o texto normalmente é guiada por preocupações dogmáticas que não estavam em relevo na época, quanto à Santíssima Trindade.

Um trecho particularmente significativo é Romanos 8, onde encontramos, lado a lado, momentos que não podem ser vertidos como “espírito” (humano) e outros que não podem ser vertidos como “Espírito” (divino), e vários, entre eles, que podem ser vertidos das duas maneiras, mudando a maneira como lemos o capítulo. Paulo não parecia particularmente preocupado em deixar clara a diferença, inclusive porque ele não presumia nossas discussões sobre natureza e graça.

Um exemplo significativo de texto gramaticalmente ambíguo (vv. 5–6):

☩ “Porque os que são conforme a carne cogitam (phronousin) das coisas da carne; mas os que são conforme o espírito, cogitam das coisas do espírito. Porque a cogitação (phronēma) da carne é morte, mas a do espírito é vida e paz.

Se vertermos como “o Espírito”, a dicotomia do texto é entre o humano e o divino, mas, se vertermos como “espírito”, a dicotomia é entre duas dimensões da própria pessoa humana. Exatamente o mesmo aparece em Gl 5:17, texto que apresenta esse conflito entre carne e E/espírito.

Assim, se escolhemos “Espírito”, temos uma leitura mais agostiniana; se escolhemos “espírito”, uma leitura mais platônica — e curiosamente mais judaica também. Na segunda leitura, o Espírito Divino vem (no contexto) para solucionar uma cisão entre duas partes da natureza humana. Um dos motivos pelos quais essa leitura é particularmente interessante é o modo como ela se mostra como perfeita continuidade para a cisão que aparece no capítulo anterior (vv. 21–23):

☩ “Então, ao querer fazer o bem, encontro a lei de que o mal reside em mim. Porque, no tocante ao homem interior, tenho prazer na lei de Deus; mas vejo, nos meus membros, outra lei que, guerreando contra a lei da minha mente, me faz prisioneiro da lei do pecado que está nos meus membros.”

Rev. Gyordano M. Brasilino

O que é blasfêmia contra o Espírito Santo?

Uma pessoa perguntou (1) o que é blasfêmia contra o Espírito Santo, (2) por que (supostamente) o sangue de Cristo não seria suficiente para nos limpar dela, e (3) por que é especificamente dirigida ao Espírito Santo (não ao Pai ou ao Filho).

Blasfemar contra o Espírito Santo é aquilo que a expressão indica, e que a versão mateana comunica: “falar contra o Espírito Santo” (Mt 12:32). Blasfemar é insultar algo sagrado (especialmente Deus) — é um sacrilégio de palavras. Falou contra o Espírito Santo? Blasfemou contra ele. Foi o que fizeram os fariseus quando deram (indiretamente) ao Espírito Santo o nome de Belzebu. Isso se enquadra na regra mais ampla de que somos julgados conforme o que falamos (Mt 12:36– 37; cf. Mt 5:22). Parece, então, um pecado relativamente fácil de cometer, embora haja mais a considerar.

O sangue de Cristo é suficiente para nos purificar de todo pecado, se o confessarmos e andarmos na luz (deixando o pecado), como lemos em 1João 1. Ali em Mt 12, Cristo não fala de pecados confessados — do contrário, Paulo jamais poderia ter se convertido, pois, enquanto perseguidor dos cristãos, provavelmente blasfemou muitas vezes (cf. At 26:11) —, mas apenas de pecados cometidos. Com exceção desse, todo tipo de pecado cometido pode ser perdoado ou desculpado (sem referência explícita a confissão) — não digo que ele necessariamente será perdoado, embora Cristo use palavras bem fortes, talvez hiperbólicas (“todo aquele que disser uma palavra contra o Filho do homem ser-lhe-á perdoada”, Lc 12:10).

A condenação extrema desse pecado envolve o fato de que a gravidade da nossa culpa por um pecado cometido é, dentre outros fatores, proporcional à clareza que temos da verdade que o envolve. Quando o Espírito Santo se mostra presente através de um sinal (Mt 12:28), é impossível alegar ignorância. Então é um pecado maximamente consciente, contra Deus, no exato momento em que ele nos dá um presente claro e sinal de sua presença, e nós o rejeitamos publicamente, contaminando outras pessoas — que, no texto bíblico, começavam a se interessar por Jesus e se perguntar se ele não seria o Cristo. É uma ofensa imensa, então não adianta dizer que os fariseus não sabiam que ali agia o Espírito Santo. Sua “ignorância” não é desculpável. A blasfêmia contra o Espírito Santo é, nesse contexto, um anti-evangelho que nega ação do Espirito.

É importante distinguir a linguagem bíblica da linguagem dogmática posterior. Quando Cristo disse tais palavras, ele não estava diante de pessoas que conheciam o dogma da Trindade e que soubessem distinguir hipóstase e “ousia” com rigor capadócio. Quando ele usa palavras como “Filho do Homem” e “Espírito Santo”, não se refere necessariamente à Segunda e à Terceira Pessoas da Trindade, embora suas palavras (assim como o restante do Novo Testamento) tenham servido de base para as definições posteriores. Os biblistas sabem como é complicada essa questão de traduzir “Espírito Santo” no grego do NT.

Há vários outros textos, como Mt 24:36, que geram problemas se presumirmos que Cristo falava a pessoas que conheciam o dogma da Trindade, mas que desaparecem se não tivermos essa premissa anacrônica.

Se Cristo tivesse falado de Pessoas Divinas específicas, o texto estaria um pouco desalinhado com o contexto, já que a blasfêmia dos fariseus foi principalmente contra a Segunda Pessoa, contra o próprio Cristo ali realizando milagre (pelo Espírito Santo). Na verdade, em razão da unidade das Pessoas Divinas, ainda que nossa intenção possa ser repartida, toda blasfêmia contra uma delas é blasfêmia contra as três.

Então não é uma questão de dizer que a uma blasfêmia é tratada de maneira diferente a depender da pessoa a quem se dirige, pois isso seria muito arbitrário e inexplicável. Naquele momento, o que parece é que Cristo usa a expressão “Filho do Homem” no sentido usual que tinha para os seus ouvintes, isto é, “ser humano”, e “Espírito Santo” também no sentido usual, ou seja, a “presença do poder divino”, sem especificar hipóstases. Então ele dizia algo como: quem blasfema contra mim — enquanto homem, sem saber quem eu sou — pode até ser desculpável, mas quem testemunhou meu poder e, mesmo assim, se endureceu, é indesculpável.

A parte mais amável dessas palavras de Cristo é que elas dão a entender que certos pecados têm perdão no mundo vindouro. Do contrário, não faria muito sentido Cristo dizer: “não tem perdão nem neste mundo nem no vindouro“. Não que isso fosse segredo para os judeus, é claro.

Rev. Gyordano M. Brasilino

O Batismo com o Espírito Santo no livro de Atos — O que eu penso disso?

Antes de tudo, devo dizer que acredito na experiência pentecostal. Assim como diversos teólogos, minhas dúvidas não são sobre a experiência, mas sobre a descrição teológica dela, isto é, no modo como a experiência pentecostal é ligada a conceitos bíblicos ou quase-bíblicos como “batismo no Espírito Santo”, “falar línguas”, “enchimento” e “plenitude” do Espírito, e coisas semelhantes, o que gera consequências para o sentido que essa experiência tem, deve der ou poder ter na comunidade cristã. Acredito que posição que eu defendo não descarta, antes amplia o pensamento pentecostal nesse assunto.

Acredito que a interpretação pentecostal é melhor que a leitura reformada do “batismo no Espírito Santo” no livro de Atos dos Apóstolos. Enquanto a leitura pentecostal simplesmente aceita a “estranheza” dos textos, sem tentar forçar uma pneumatologia alheia a ela, me parece que a leitura reformada procura forçar o texto a enquadrar-se na situação vivenciada pelos próprios reformados e suas igrejas, onde essas coisas estranhas não costumam acontecer, assim como em sua teologia da “regeneração”. Isso não significa que a leitura reformada não seja capaz de fornecer observações pertinentes, nem significa que qualquer dois dos grupos seja monolítico na interpretação de todos os textos relevantes.

Porém acredito que, em razão do anti-sacramentalismo comum entre os pentecostais, algumas conexões presentes nos textos lhes escapam. Além disso me parece o que os pentecostais procuram estabelecer, através das experiências diferentes no livro de Atos, uma regra facilmente aplicável a hoje. Penso que não haja uma regra, ou que a regra, na verdade, seja mais ampla do que imaginam. Essa hermenêutica anti-sacramental afeta principalmente a interpretação dos capítulos 2 (Pentecostes), 10 (Cornélio) e 19 (Discípulos em Éfeso) do livro de Atos dos Apóstolos, precisamente os três textos em que aparece o “falar em línguas” conectado à experiência de recebimento do Espírito Santo, além de traços relevantes dos capítulos 8 (Samaria) e 9 (Paulo). Quando deixamos de lado o viés anti-sacramental, fica mais nítida a regra que devemos observar para a recepção e vivência do Espírito Santo.

Alguns fatores a considerar: (1) o Espírito Santo é concedido, no livro de Atos, principalmente e presumivelmente através do batismo (2:38; 9:17-18) e da imposição de mãos (8:15-20; 19:5-6), dois atos eclesiásticos que ocorrem sempre na mesma sequência, isto é, primeiro o batismo e depois a imposição de mãos; (2) o livro de Atos descreve a experiência nesses momentos como “receber” o Espírito Santo (1:8; 2:38; 8:115,17,19; 10:47; 19:2), o “dom do Espírito” (At 2:38; 8:20; 11:17), dizendo que foram “cheios” do Espírito Santo (2:4; 9:17) ou que o Espírito “caiu” ou “desceu” sobre eles (8:16; 10:44; 11:15); não se diz que os personagens bíblicos foram “batizados” no Espírito Santo, embora a promessa do Batismo seja invocada na explicação do Pentecostes e no incidente da casa de Cornélio (1:5; 11:16).

Os cinco textos mais relevantes, no livro de Atos, para entender essa questão são os capítulos 2 (Pentecostes, Jerusalém), 8 (Samaria), 9 (Paulo, Damasco), 10 (Cornélio, Cesareia) e 19 (Éfeso). Esses textos mais ou menos acompanham a expansão da Igreja tanto de modo geográfico (Jerusalém, Samaria, Damasco, Éfeso) como étnico (judeus, samaritanos, gentios).

No primeiro caso, no dia de Pentecostes, o mais importante, a “descida” do Espírito Santo sobre a comunidade certamente é precedida de orações comunitárias de conteúdo desconhecido (1:14), mas acontece de modo “a-sacramental”. No entanto, após interpretar o evento ligando ao envio da “promessa do Espírito Santo” por Cristo (2:33) e ao seu senhorio (2:36), Pedro diz aos ouvintes que, caso se arrependam e sejam batizados para remissão de pecados, receberão “o dom [dōreá] do Espírito Santo” (2:38), fazendo referência à mesma “promessa” (2:39). A promessa é aquela de Atos 1:5,8: “sereis batizados com o Espírito Santo”. Assim, Pedro oferece aos presentes aquele dom através (também) do Batismo. Não se fala de imposição de mãos ou outra coisa, embora o texto seja demasiado compacto para que se tire muitas conclusões. Esse é um dos três textos em que se fala de “línguas” no recebimento do Espírito Santo.

No segundo caso, em Samaria, os samaritanos evangelizados já haviam recebido o batismo sacramental e crido na pregação apostólica, através do ministério de Filipe (provavelmente o helenista de Atos 6), mas ainda não haviam recebido o Espírito Santo. Dois apóstolos, Pedro e João, descem a Samaria para orar e impor as mãos sobre os samaritanos, para que recebam também o Espírito Santo. O Batismo está, nesse texto, bem claramente atrelado à Imposição de Mãos, e a linguagem empregada é “descida” (8:16), “recebimento” (8:15,19) ou “concessão” do Espírito Santo (8:17). O texto não menciona “línguas”, “profecia” ou outros sinais ligados ao recebimento do Espírito Santo.

No terceiro caso, o de Paulo, não temos uma comunidade, mas um indivíduo, que recebe a ministração de outro: Ananias, que, embora não seja explicitamente contado como apóstolo, é mencionado como um “discípulo” (9:10) observante da Torá (22:12). Ele é enviado pessoalmente por Jesus através de uma visão (9:10-16), não por algum dos apóstolos, e chega três dias depois de Paulo ter tido a visão com Jesus. Ananias lhe descreve o propósito de sua vinda nos seguintes termos: “…para que recuperes a vista e fiques cheio do Espírito Santo” (v. 17), ou seja, cura e enchimento do Espírito. O texto descreve como isso aconteceu: “Imediatamente, lhe caíram dos olhos como que umas escamas, e tornou a ver. A seguir, levantou-se e foi batizado.” (v. 18). Sabemos que a cura aconteceu por imposição de mãos (9:12), mas enchimento do Espírito Santo corresponde ao “e foi batizado”. Esse batismo é o sacramento, como nos certifica outra versão da mesma história, que segue a mesma sequência: cura e depois batismo sacramental (22:13-16). Nenhuma das duas versões menciona fenômenos carismáticos como línguas ou profecias.

No quarto caso, o da casa de Cornélio, uma família inteira recebe o Espírito Santo: “caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra” (10:44; cf. 11:15), “maravilharam-se de que o dom [dōreá] do Espírito Santo se derramasse também sobre os gentios” (10:45), “receberam como nós o Espírito Santo” (10:47), o que é sinalizado através do “falar em línguas”. Àquelas pessoas, Deus “concedeu o mesmo dom [dōreá]” que aos apóstolos (11:17). Logo em seguida, eles são batizados sacramentalmente; para Pedro, não faria sentido impedir de batizar. Assim, embora o recebimento do Espírito ocorra logo antes do batismo sacramental, Pedro vislumbra uma conexão clara entre as duas coisas. Além disso, na verdade, Pedro estava justamente falando sobre o Batismo: “todos os que nele crêem receberão o perdão dos pecados pelo seu nome.” (10:43). Pedro não disse aí que todos os que creem receberão o perdão porque creem, mas que todos os que creem receberão o perdão “pelo seu nome” (dia tou onomatos autou), isto é, através do seu nome. Essa é a linguagem dos textos batismais de Atos (2:38; 22:16). Essa é a fórmula empregada para atos de poder realizados no nome de Jesus, como cura e exorcismo (At 3:6; 4:7,10,30; 9:14,21; 16:18; 19:13); o Batismo aparece aí como um desses atos de poder realizados “em nome do Senhor Jesus”. Tanto em Atos 8 como em Atos 10, o recebimento do Espírito Santo, embora tenha conotações proféticas e esteja, aqui, ligado à adoração a Deus, não se tem em vista uma preparação ministerial. Tanto no acontecimento em At 10 quanto em sua explicação no capítulo seguinte, tem-se em vista a salvação.

No quinto caso e último caso, o dos doze discípulos em Éfeso, aparece toda a sequência: Batismo (sacramento), Imposição de mãos, línguas, profecia. A linguagem usada é “veio sobre eles o Espírito Santo” (19:6), o que ocorre a partir da pergunta de Paulo sobre se “Recebestes… o Espírito Santo” (19:2).

Esses textos não indicam uma “segunda bênção”, mas uma única bênção, que às vezes é recebida tempos depois do batismo sacramental, ou um pouco antes. Ao visualizar uma só bênção, os reformados se aproximam da verdade, mas essa “bênção única” não é a “regeneração” da qual eles falam; é algo posterior ao arrependimento e à fé, às vezes posterior ao Batismo. Se há uma indicação de uma lógica de duas bênçãos, ela está justamente nos dois atos eclesiásticos: Batismo e Imposição de Mãos, embora eles não sejam tratados como os meios exclusivos, e sim os meios ordinariamente esperados da dação do Espírito Santo. Por isso, a leitura histórica mais tradicional desses atos eclesiásticos é: o Batismo e a Imposição de Mãos de fato conferem duas “bênçãos” distintas ambas no entanto, ligadas à dotação do Espírito Santo, uma em continuidade com a outra, às vezes uma sendo vista como aprofundamento e “conclusão” da outra. Assim, uma raiz da noção de segunda benção está plenamente lá na tradição, mas como uma segunda bênção sacramental. No modus operandi divino, no livro de Atos, não há duas bênção, mas uma mesma doação do Espírito divino.

Como existe uma correlação entre os atos eclesiásticos sacramentais e adaptação do Espírito, a expectativa não é de que a infusão do Espírito ocorra através de orações e de buscas do batismo no Espírito Santo (a menos que isso se referia à oração sacramental, como em At 8:15); espera-se que ocorram nos próprios atos sacramentais. Não existe uma noção de “busca” do Batismo no Espírito Santo no livro de Atos. Saindo do livro de Atos, podemos falar de uma busca do “enchimento” do Espírito Santo e de uma “vida no Espírito”, nas cartas paulinas.

Não é difícil perceber que, no livro de Atos dos Apóstolos, o Espírito Santo é dado como “poder” missionário e profético, como um “capacitador” da igreja para sua missão e ministério particularmente dos apóstolos, como testemunhas poderosas da Ressurreição. A caracterização do Espírito Santo como Espírito Profético aparece tanto na promessa de Jesus (At 1:8) quanto na interpretação dada por Pedro no próprio Pentecostes (2:17-18). No entanto, o caso dos samaritanos e o de Cornélio são diferentes, tendo em vista principalmente a salvação, assim como é diferente a ligação do Espírito Santo com batismo em Gálatas 3 em termos soteriológicos, não apenas ministeriais, então não se pode fazer uma separação muito radical entre pneumatologia paulina e pneumatologia lucana.

Diante dessas considerações, minha posição é a de que o batismo no Espírito Santo é a benção prometida e selada no sacramento do Batismo (I), aprofundada apostolicamente na imposição de mãos (II) e renovada, pela fé, muitas vezes ao longo de nossa vida, particularmente através dos dons espirituais (III). Em outras palavras, o batismo no Espírito Santo é a vida cristã. É a dimensão da vida cristã ligada a um poder profético, não como o ministério de uma elite espiritual, mas disseminado em toda a comunidade messiânica. Aquilo que é prometido no Batismo e aprofundado na imposição de mãos pode ser vivido imediatamente, mas frequentemente os cristãos levam anos para “acessarem” ou “ativarem” as promessas recebidas. Com isso, quero dizer que há “um só batismo” (Ef 4:5), o sacramento, um mistério único que contém compactamente e assinala profeticamente todo o nosso percurso no caminho de Jesus.

Nesse sentido, o momento em que recebemos o sacramento do Batismo não indica necessariamente o primeiro momento em que desfrutamos plenamente da benção profética ali ministrada. O mesmo se dá com a Imposição de Mãos. Em analogia com essas coisas, podemos colocar a oração: se eu oro hoje pela cura de um enfermo, desejo que sua cura aconteça hoje, devo orar para que ela aconteça agora, devo esperar a intervenção de Deus para o presente momento, mas não sou o dono da realização dos seus efeitos, pois eles pertencem a Deus, e por isso podem se realizar algumas horas depois ou amanhã, quando a pessoa que recebeu a oração hoje desfrutará então da cura impetrada. Ou seja, o momento em que a oração é feita e o momento em que a resposta é recebida podem ter um intervalo de bastante tempo.

Assim também, a experiência de enchimento do Espírito Santo, que deve ser esperada para o sacramento ou sinal sacramental, talvez só seja ativado tempos depois. Do mesmo modo, assim como há muitas maneiras pelas quais Deus curou e cura (simples oração individual, intercessão, imposição de mãos, unção com óleo, banho “profético”, cuspe…), Deus pode ministrar seu Espírito de vários modos. Não precisamos estabelecer uma regra para Deus, mas apenas para nós mesmos. Não precisamos crer em duas bênçãos ou em três bênçãos. Podemos acreditar em infinitas bênçãos como infinitas manifestações do Espírito. O Espírito Santo sempre tem mais. Mas é sempre também o mesmo Espírito Santo, a mesma bênção indivisa, o mesmo mistério inesgotável.

Rev. Gyordano M. Brasilino

A Igreja é Templo do Espírito. O que isso significa?

File:Luca Giordano - Christ Cleansing the Temple - WGA09000.jpg - Wikimedia  Commons

O Novo Testamento nos ensina explicitamente que a Igreja é o Santuário de Deus (2Co 6:16), o Santuário do Espírito Santo (1Co 3:16), a Casa de Deus (Ef 2:21-22; 1Tm 3:15). Embora isso possa ter um aspecto pessoal, na qual os corpos dos cristãos são tratados como esse santuário de Deus (1Co 6:19; cf. Jo 14:23) — assim como o corpo também pode ser casa de demônios (cf. Mt 12:43-45 par.) —, os textos bíblicos, em sua maioria, trazem uma dimensão corporativa à imagem do Templo: a comunidade (“vós”) é um santuário. Quando começou a adorar em “templos” ou “santuários” seus, a Igreja manifestou sua própria natureza interior: a Igreja é um prédio edificado para Deus. O edificador desse prédio é Jesus (Mt 16:18). O prédio “físico” é um símbolo da construção espiritual, aliás, um santuário ainda em construção (1Co 3:9-17; Ef 2:19-22; 1Pe 2:5), ainda não completo.

O que significa dizer que a Igreja é Templo do Espírito Santo? Que implicações isso tem para o modo como vemos e vivenciamos a Igreja? Numa abordagem mais superficial, poderíamos tomar simplesmente o sentido que nos parece ser mais óbvio hoje: a Igreja é o Templo do Espírito Santo, então o Espírito Santo mora na Igreja — o que seria plenamente verdade. Mas, quando o Novo Testamento usa essa imagem, ela sempre traz consequências para o propósito e a vida da Igreja, consequências que estão em plena continuidade com a imagem conceitual que Jesus e seus seguidores, assim como o povo judeu, tinham sobre o Templo. Portanto a única maneira de entender plenamente o sentido dessa linguagem é vislumbrar o propósito e a importância do Templo no Antigo Testamento e na época de Jesus. O que era o Templo para os antigos hebreus?

Em primeiro lugar, é importante notar que, além de katoikētērion (“habitação”), naos (“templo”) e oikos (“casa, família”), o Novo Testamento usa a palavra hagion (“santuário”) para descrever a Igreja. Essa é uma palavra especial, que ajuda a dar sentido a todas as demais. Santuário é o lugar da habitação da santidade divina, o lugar do seu culto. Em certa narrativa bíblica, mesmo quando não havia um templo, o povo israelita tinha como santuário de Deus o Tabernáculo. O Tabernáculo e o Templo são lugares distintos, o temporário e transitório dando lugar ao mais permanente e sólido, mas ambos são santuários dedicados a Deus. O santuário é a casa de Deus, o lugar de sua habitação. Também os santuários politeístas eram casas dos seus deuses (cf. Jz 9:4,27; 1Rs 16:32 etc.). Sobre o santuário de Israel, o Antigo Testamento conta:

Êxodo 25:8-9
“E me farão um santuário [miqdāš], para que eu possa habitar [šāḵan] no meio deles. Segundo tudo o que eu te mostrar para modelo do tabernáculo e para modelo de todos os seus móveis, assim mesmo o fareis.”

Êxodo 29:43-46
“Ali, virei aos filhos de Israel, para que, por minha glória, sejam santificados, e consagrarei a tenda da congregação e o altar; também santificarei Arão e seus filhos, para que me oficiem como sacerdotes. E habitarei no meio dos filhos de Israel e serei o seu Deus. E saberão que eu sou o Senhor, seu Deus, que os tirou da terra do Egito, para habitar [šāḵan] no meio deles; eu sou o Senhor, seu Deus.”

Deus havia prometido que, num dado momento, habitaria no meio do seu povo novamente (Lv 26:11-12; Zc 2:10-11), o que se realiza em Cristo (cf. Jo 1:14; 2:21) e, através dele, em toda a igreja. A correspondência entre Cristo e o Templo é tão grande que, quando ele está morrendo, o Templo morre com ele — logo antes ou logo depois, a depender do evangelho. Essa continuidade do santuário e transformação dos indivíduos em santuário (naomorfose), no Evangelho de João, se dá através da Eucaristia (6:56) e da obediência do amor (14:23). São práticas que formam a Igreja como santuário.

O Templo era só a sombra da realidade presente. Então a Igreja é mais do que o antigo Templo. Mas certamente não é menos. Diante disso, devemos responder à pergunta: o que significava o Templo para o povo de Israel?

1. O Templo é um lugar de sacrifícios. 1ª Pedro 2:5 ressalta essa dimensão sacrificial, quando aplica a imagem do santuário aos cristãos; é uma casa espiritual para sacrifícios espirituais. No código deuteronômico, os sacrifício mais regulares só podiam ser feitos no Templo, e em nenhum outro lugar da terra (Dt 12). Isso incluía os dízimos, que eram uma modalidade de sacrifício, além de outras ofertas. Por ser um lugar único, provocava as saudades de que lemos nos Salmos 42 e 43. Paulo alude a essa dimensão sacrificial quando escreve:

Romanos 15:15-17
“Entretanto, eu lhes escrevi, em parte mais ousadamente, como para fazer com que vocês se lembrem disso outra vez, por causa da graça que me foi dada por Deus, para que eu seja ministro [leitourgon] de Cristo Jesus entre os gentios, no sagrado encargo de anunciar [hierourgounta] o evangelho de Deus, de modo que a oferta [he prosphora] deles seja aceitável, uma vez santificada pelo Espírito Santo. Tenho, pois, motivo de gloriar-me em Cristo Jesus nas coisas concernentes a Deus.”

Paulo usa aí uma linguagem sacerdotal, hierática, litúrgica. Seu ministério era sacerdotal: ele era um ministro sacerdotal ou litúrgico, com um trabalho de ministrar sacerdotalmente o evangelho para que, com isso, consagre a Deus as ofertas dos gentios. Ele via esse ministério como um motivo para se gloriar, quanto às coisas divinas. Ele via a oferta que as nações davam para o seu ministério (particularmente para a coleta para os cristãos pobres em Jerusalém) como uma oferta a Deus (cf. Fp 4:18), e ele era o meio pelo qual essa ofertas eram santificadas. Templo é um lugar de sacerdotes. Em outras palavras: os sacrifícios que antes eram entregues aos sacerdotes da Lei agora são entregues ministros sacerdotais cristãos; não diretamente a Deus, mas através de ministros que detêm essa glória ou jactância (kauchēsis). Assim, é natural que vejamos no Novo Testamento as ofertas serem depositadas aos pés dos apóstolos. A Igreja é o Novo Templo, então é lá que entregamos nossas ofertas.

Mais do que isso: o Templo não é só o lugar de sacrifício, e o único lugar legítimo, mas o lugar cujo culto principal consiste em sacrifício. Não custa lembrar: não falamos aqui da Igreja como sinagoga de Deus (lugar de ensino e pregação), mas com o templo de Deus (lugar de sacrifício e adoração). Embora essa distinção não deva ser exagerada no Novo Testamento, uma vez que as celebrações cristãs herdaram tradições estruturais da sinagoga, ela nos diz muito sobre qual deve ser o centro da ação da Igreja.

2. O Templo é um lugar de perdão e purificação. Os antigos israelitas se dirigiam Templo para receberem a expiação por seus pecados e outras impurezas, através dos ritos que ali se realizavam. O Templo absorvia as muitas impurezas do povo (Lv 16). Nesse sentido, os ministros da igreja continuam com a missão de trazer o perdão divino (Jo 20:23; Tg 5:14-15), que ocorre primeiramente através do Batismo (At 2:38), assim como impetrar a misericórdia do alto sobre o povo de Deus. A Igreja é um lugar onde a condição humana de pecado, doença, debilidade, culpa, vergonha e imperfeição é reconhecida e reconciliada com Deus, sendo esse o “ministério da reconciliação” mencionado por Paulo (2Co 5). É e deve ser um lugar de compaixão.

3. O Templo é um lugar sagrado. Por isso, é preciso saber “como convém andar na casa de Deus” (1Tm 3:15). Quem destrói esse lugar sagrado é destruído por Deus (1Co 3:17). Também por isso, a Igreja é um lugar de rituais, como orações, sacramentos e outros sinais. O Templo é sagrado no sentido de que ele pertence a Deus, se remete a Deus; desonrar o que acontece no Templo é desonrar a Deus, como protesta o profeta Malaquias ao reclamar do pão imundo, do descuido com a mesa do Senhor (altar), do animais impróprios, do ensino distorcido. Nesse sentido, a Igreja é sagrada, pertence a Jesus, e tudo que está nela pertence a Jesus de um modo especial, o que exige a devido cuidado na reverência, na ordem, no temor, no zelo. Ao mesmo tempo que é um lugar que reconhece e trata nossas impurezas, é ambiente que exige pureza de coração.

4. O Templo é um lugar de bênção. Deus prometeu abençoar o povo no lugar onde seu nome habitasse (cf. Êx 20:24). Os sacerdotes tinham, portanto, a responsabilidade de transmitir essa bênção ao povo (Lv 9:23; Nm 6:23-27; 2Cr 30:27). Como lemos nos salmos várias vezes, a bênção de Deus flui desde Sião (Jerusalém, a cidade do Santuário) para todo o povo:

14:7; 53:6 “Oh, se de Sião tivera já vindo a redenção de Israel…”

20:2 “Do seu santuário envie socorro e desde Sião te sustenta.”

128:5 “O Senhor te abençoe desde Sião…”

134:3 “De Sião te abençoe o Senhor…”.

Profetas como Ezequiel e Zacarias contemplam a realização disso através das correntes do Espírito Santo transbordando do Templo para todo o mundo. A imagem do templo como manancial de águas procede do simbolismo do Templo como um novo Éden, ou do Éden como um santuário, noção bem arraigada na religião de Israel (cf. Sl 36:7-9; Jr 2:13). Por isso, sentir saudade da presença divina no santuário é o mesmo que sentir sede (Sl 42:1-4; 63:1-2; 84:1-6).

Mesmo com a promessa de Ez 11:16, de que Deus seria, por um tempo, um santuário para os exilados de Israel vivendo na Babilônia e bonitos lugares, os exilados oravam em direção a Jerusalém, como fazia o profeta Daniel (Dn 6:10) e como a oração de dedicação do Templo abençoava (1Rs 8). A benção celestial viria desde Sião, ou seja, através de Sião, como uma porta pela qual a realidade divina invade o mundo.

Se a Terra Santa era o lugar mais sagrado do mundo, Jerusalém era o lugar mais sagrado de Israel — a cidade mais amada por Deus (Sl 87:1) —, e o Templo era o lugar mais sagrado de Jerusalém. Esses ambientes eram os únicos em que Deus podia ser adorado — pois como poderíamos “entoar o canto do Senhor em terra estranha?” (Sl 137:4). Ser desterrado significava praticamente ser entregue a um culto idólatra (Dt 4:27-28; 28:64; 1Sm 26:19; Jr 26:14). Por isso, com a autorização de Eliseu, Naamã transportou terra de Israel para a Síria, para lá prestar o culto ao Senhor (2Rs 5:17). Tudo isso funciona muito bem à luz da geografia sagrada de Dt 32:8-9, texto que, originalmente, ensina que as nações da terra foram entregues ao governo de diversos espíritos poderosos (filhos de Deus) enquanto Israel seria a porção do Senhor.

Diante disso, é perfeitamente compreensível que aquele que é excomungado na Igreja seja, por isso, entregue a Satanás (1Co 5:5; 1Tm 1:20). Ele se coloca fora do culto divino, fora do alcance da benção divina. O Templo é o centro da esfera de domínio régio de Javé — é o seu trono na terra (Jr 3:17; 14:21; 17:12; Ez 43:7). Perder a comunhão com o santuário é ser lançado entre os deuses. É a partir do Templo que Deus reina. Nesse sentido, a Igreja é o reino de Deus. O domínio do Rei e o domínio do Sumo-sacerdote são um só (Sl 110): o domínio de Cristo.

5. O Templo é um lugar de oração. Esse propósito do Templo está em íntima continuidade com todos os anteriores. A oração de dedicação feita por Salomão (1Rs 8), já mencionada acima, encara o Templo como o lugar em que as orações são ouvidas, mesmo para as pessoas que, orando distantes dali, se encurvassem naquela direção. Os salmos exemplificam esse sentimento direcional:

28:2 “Ouve-me… quando erguer as mãos para o teu santuário.”

134:2 “erguei as mãos para o santuário e bendizei ao Senhor.”

O profeta Isaías fala do Templo como “casa de oração para todos os povos” (56:7), palavras depois repetidas por Cristo (Mc 11:18). Isso significa, consequentemente, que a Igreja, enquanto Templo, é uma comunidade orante; seu propósito de existência tem a ver com a oração, com a ligação dos homens com Deus. Desde o princípio, a vida de oração era partilhada pela Igreja (cf. At 1:13-14; 2:27). De fato, essa celebração da Igreja inclui numa mesma celebração, a terra e os céus (Hb 12:22-24).

6. O Templo é lugar de anjos. O Templo tem uma íntima ligação com as realidades celestiais, em razão de que a Escritura continuamente diz que Deus habita nos céus e que ele habita no Templo; o Templo segue o modelo celestial, como sombra dele (Hb 8:5). O Templo é o lugar onde a glória divina aparece, onde os anjos sobem e descem (cf. Gn 28:12-17; Ec 5:1-6). Em razão disso, todo o Templo era decorado com querubins (1Rs 6). O Templo funciona como lugar de confluência entre a realidade terrestre e a celeste (Is 6), o que é natural, já que, como vimos, o santuário é trono de Deus.

Assim, a Igreja é também lugar de anjos, e, também, detentora das chaves do reino, de modo que pode ligar ou desligar as coisas na terra em comunhão com o céu (Mt 16:19; 18:18-19); a Igreja, enquanto ambiente celestial, está em comunhão com as coisas superiores (Gl 4:26; Hb 12:22-24). É por isso que o Novo Testamento presume várias vezes que estamos certados de anjos: o véu é usado “por causa dos anjos” (1Co 11:10), João abençoava através de anjos (Ap 1:4-5), Paulo conjura diante dos anjos (1Tm 5:21).

7. Lugar de contemplação da face de Deus. Os salmos, e o Antigo Testamento em geral, falam diversas vezes de como o Templo é o lugar onde se podia contemplar a face, a beleza, a majestade, a glória de Javé. Essa dimensão contemplativa incluía o esclarecimento da vontade divina (Sl 73:16-17). Por exemplo:

26:8 “Eu amo, Senhor, a habitação de tua casa e o lugar onde tua glória assiste.”

27:4 “Uma coisa peço ao Senhor, e a buscarei: que eu possa morar na Casa do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a beleza do Senhor e meditar no seu templo.”

63:2 “Assim, eu te contemplo no santuário, para ver a tua força e a tua glória.

65:4 “Bem-aventurado aquele a quem escolhes e aproximas de ti, para que assista nos teus átrios; ficaremos satisfeitos com a bondade de tua casa — o teu santo templo.”

Essa glória era, em parte, ocultada pelo véu que escondia o trono divino, como um “carro” entre os querubins (cf. 1Cr 28:18; Jó 26:9; Sl 80:1; Is 37:16-17). Semelhantemente, Moisés, depois de contemplar a glória divina e reter algo dela, provocando temor nas pessoas, ocultava seu rosto com um véu (Êx 34:29-34). Usando essa história, Paulo fala de como os ministros do evangelho resplandecem, sem temor, uma glória diferente, sendo transformados na imagem do Senhor (2Co 3:18), e de como as mulheres usavam um véu para ocultarem sua própria glória (1Co 11:15). Isso significa também que a Igreja, enquanto Templo, não é apenas um lugar em que se ensina sobre a glória, mas um lugar no qual a glória está presente, um lugar da presença divina. Isso afeta diretamente o modo como vemos, por exemplo, a Mesa do Senhor, a Eucaristia. Se o culto do antigo Templo tinha em si a glória divina, quanto mais o do novo!

8. O Templo é um lugar para todas as nações. O Templo não é só casa de oração, mas casa de oração para todos os povos. Sempre houve o interesse de Deus de que as nações prestassem culto no seu Templo, de que dali procedesse a luz de Deus para todos. Na oração de dedicação, Salomão ora intencionalmente por isso:

1 Reis 8:41-43
Também ao estrangeiro, que não for do teu povo de Israel, porém vier de terras remotas, por amor do teu nome (porque ouvirão do teu grande nome, e da tua mão poderosa, e do teu braço estendido), e orar, voltado para esta casa, ouve tu nos céus, lugar da tua habitação, e faze tudo o que o estrangeiro te pedir, a fim de que todos os povos da terra conheçam o teu nome, para te temerem como o teu povo de Israel e para saberem que esta casa, que eu edifiquei, é chamada pelo teu nome.

Nesse sentido, a comunidade Igreja-Templo jamais pode estar limitada a um povo, tribo, língua ou nação, nem mesmo a uma congregação. Jamais pode estar presa a privilégios de nação ou província. Ela tem sempre uma dimensão e uma missão universais.

Rev. Gyordano M. Brasilino

Dez ensinamentos da Bíblia negligenciados no mundo evangélico


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A fidelidade dos evangélicos à Sagrada Escritura às vezes é frustrada por certa reticência em confessar aquilo que ela mesma ensina de modo claro e distinto sobre diferentes assuntos. Essas palavras não atingem a totalidade dos evangélicos, mas atingem em cheio certo tipo de evangelicalismo inculto de origem americana. Penso que a maioria dos evangélicos brasileiros, especialmente os de igrejas mais recentes, é atingida em ao menos um destes dez ensinamentos bíblicos.

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Solus Paulus: a Vida Eterna como Dom e como Fruto

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Em verdade, em verdade vos digo: quem crê em mim tem a vida eterna. João 6:47

Em um sentido, Cristo sozinho realiza a condição para nossa justificação e salvação. Em outro sentido, a fé é condição de nossa justificação, e, em outro sentido, outras qualificações e atos também são condições da salvação e justificação. Jonathan Edwards, Justification by Faith Alone

Os ensinos das Sagradas Escrituras resistem a simplificações. O próprio Deus é infinitamente imanente e infinitamente transcendente às criaturas, sendo igualmente aquele em quem “vivemos, e nos movemos, e existimos” e aquele que “habita na luz inacessível”. Para nós, essas realidades são paradoxais, misteriosas e desconcertantes. O Deus revelado não é desconhecido apenas, mas desconhecido de maneiras que sequer podemos imaginar. Por outro lado, como a criatura reflete o Ato Criador, por toda parte a névoa do Altíssimo se faz notar. Nada há do real que possamos compreender inteiramente. Continue lendo “Solus Paulus: a Vida Eterna como Dom e como Fruto”

Sobre Regeneração

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“Portanto, interpreto o arrependimento com uma palavra: regeneração, cujo objetivo não é outro senão que em nós seja restaurada a imagem de Deus, a qual fora empanada e quase apagada pela transgressão de Adão. (…) Portanto, mediante esta regeneração, somos pela mercê de Cristo restaurados à justiça de Deus, da qual havíamos decaído através de Adão, modo pelo qual ao Senhor agrada restaurar integralmente a todos quantos adota para a herança da vida. E esta restauração, na verdade, não se consuma em um momento, ou em um dia, ou em um ano; antes, através de avanços contínuos, ainda que amiúde de fato lentos, Deus destrói em seus eleitos as corrupções da carne, os limpa de sua imundície e a si os consagra por templos, renovando-lhes todos os sentimentos à verdadeira pureza, para que se exercitem no arrependimento toda sua vida e saibam que não há nenhum fim para esta luta senão na morte.” João Calvino, Institutas III, 3, 19

As metáforas têm um poder incrível de fixar, condensar e até governar nosso pensamento, especialmente quando não atentamos para o que são. Elas criam e povoam todo um mundo imaginário de idéias e símbolos, gerando em nós hábitos de pensamento que, embora pouco adaptados à realidade, interferem em nossa maneira de ler e encarar as Sagradas Escrituras e a fé cristã. O mundo dos profetas, escribas e apóstolos tem suas próprias metáforas e figuras, e elas acabam virando monstros quando inseridas em realidades diferentes sem o devido cuidado. Continue lendo “Sobre Regeneração”

Onde estiver o Espírito, ali estará a Igreja: Um elogio do movimento carismático.

“Não apagueis o Espírito.” I Ts. 5:19

O século XX mudou o panorama da cristandade de maneira dramática graças ao surgimento do movimento carismático. O movimento não perdeu seu vigor, embora tenha constantemente se adaptado e mudado de ênfase. Qualquer argumento ou crítica que se faça ao carismatismo não pode ignorar que ele foi uma força poderosa na revitalização de um número incontável de comunidades e a uma vivência mais profunda, viva e fervorosa da fé cristã, assim como a possibilidade de novos modelos de missão. Do ponto de vista teológico e doutrinal, o movimento provoca, mesmo em seus adversários, uma preocupação maior e mais saudável com a reflexão acerca da pessoa e ação do Espírito. Continue lendo “Onde estiver o Espírito, ali estará a Igreja: Um elogio do movimento carismático.”

1Co. 12:13 e o “Batismo no Espírito Santo”

Pentecostes El Greco

“Um só Senhor, uma só fé, um só batismo;” (Efésios 4:5)

“Pois por aquele Espírito, que nós recebemos no batismo, somos todos unidos em um só corpo.” (John Wesley, Notas Explicativas)

A primeira carta de São Paulo aos Coríntios é um dos escritos mais explosivos das Sagradas Escrituras. Para uma Igreja local adoecida pelo pecado obstinado e maculada pela divisão, o Apóstolo apresenta uma poderosa visão de unidade e santidade. Ela é, ao mesmo tempo, a carta mais carismática, a mais sacramental e a mais eclesiológica do Novo Testamento. Ainda que certamente não tenha sido a primeira carta de Paulo dirigida àquela Igreja (1Co. 5:9), ela mereceu a sobrevivência, e por si mesma justifica as quatro marcas da Igreja conforme o Credo Niceno: Una, Santa, Católica e Apostólica. Continue lendo “1Co. 12:13 e o “Batismo no Espírito Santo””

O Espírito Santo não é a sua consciência

Pedro nega Jesus

“Porque os que se inclinam para a carne cogitam das coisas da carne;
mas os que se inclinam para o Espírito, das coisas do Espírito.”
(Romanos 8:5)

A atividade do Espírito Santo na renovação da vida humana é simplesmente maravilhosa. Ele abre os olhos dos nossos corações, aviva nossa alma, capacita-nos a compreender as coisas divinas, conduz-nos ao arrependimento, fortalece-nos continuamente na caminhada, infunde em nós o amor divino, sob cujo influxo transcendemos finalmente a prisão do pecado e da morte. Através dele, nós nos unimos a Cristo, de modo que tudo aquilo que Cristo é, nós recebemos mediante a fé; somos lavados, santificados e justificados em Cristo. A habitação do Espírito em nós é um antegozo do Reino de Cristo e da vida eterna, assim como a fonte da esperança de que somos herdeiros de tudo isso. Continue lendo “O Espírito Santo não é a sua consciência”